CONCRETO & Construções | Ed. 89 | Jan – Mar • 2018 | 59
superiores, inicia-se a liberação da água
combinada dos produtos de hidratação
do cimento Portland, ocasionado sua de-
composição, que se estendem até cerca
de 800°C, com a descarbonatação do
carbonato de cálcio, geralmente sob a
forma de calcita. Os principais produtos
que desidratam são: etringita (~100°C),
acompanhada do monossulfato (faixa
extensa entre ~50°C e ~800°C), portlan-
dita (~450°C) e o silicato de cálcio (C-S-
-H), que desidrata em uma longa faixa de
temperaturas (50°C até 600°C ou mais)
devido à perda de água interlamelar e de-
sidroxilação [3]. Como resultado dessas
alterações químicas e microestruturais,
o concreto de cimento Portland tem, em
geral, suas propriedades mecânicas im-
pactadas negativamente. As principais
alterações experimentadas pela matriz
cimentícia após exposição ao fogo são:
fissuração, deformação excessiva, redu-
ção da resistência à compressão, desin-
tegração da pasta endurecida, perda de
aderência entre agregados e pasta, além
de possível fragmentação explosiva.
O comportamento do concreto quan-
do submetido a elevadas temperaturas é
altamente dependente do tipo de agrega-
do presente em sua composição. Agre-
gados silicosos (contendo quartzo) são
muito comumente utilizados na constru-
ção civil. O quartzo, por sua vez, apresen-
ta um aumento de volume devido à trans-
formação cristalina do
α
-quartzo (trigonal)
para
β
-quartzo (hexagonal) em torno de
575°C. Esses processos de expansão-
-retração causam microfissurações na
matriz cimentícia e agregados, os quais
afetam a integridade da estrutura. Amaio-
ria dos agregados não silicosos, como o
calcário, é estável até os 600°C-650°C.
Agregados especiais, como argilas ex-
pandidas, vermiculitas, perlita expandida
e aluminas, em geral, apresentam coe-
ficientes de expansão térmica mais pró-
ximos e até compatíveis com a pasta de
cimento. Isto faz com que a taxa de perda
de resistência residual (pós-incêndio) seja
menor em concretos contendo este tipo
de agregados, em comparação a concre-
tos com agregados convencionais.
3. PROPRIEDADES DAS FIBRAS
E DA INTERFACE FIBRA-MATRIZ
As fibras mais comumente utilizadas
nomercado são as fibras de aço emacro-
fibras poliméricas. No caso das fibras de
aço, o aço encruado tipicamente utiliza-
do nas fibras A1 (ABNT NBR 15530:07),
mais comuns no mercado, pode perder
encruamento com a exposição a tem-
peraturas acima de sua temperatura de
recristalização [4], ou seja, em torno de
500°C. O processo de recristalização
afeta diretamente as propriedades de re-
sistência e ductilidade da fibra, alterando
suas propriedades e comportamento sob
esforços de tração.
As macrofibras poliméricas são
compostas majoritariamente por fases
amorfas somadas a certo grau de cris-
talinidade conferido pelo processo pro-
dutivo de extrusão e alongamento. Essa
cristalinidade é responsável diretamente
pelas propriedades mecânicas da fibra
[5]. Uma vez que o grau de cristalinidade
é afetado diretamente pelas cargas tér-
micas, a elevada temperatura também
afeta as propriedades das macrofibras
poliméricas. Por exemplo, a temperatura
de fusão de fibras de polipropileno é de
cerca de 160ºC [4]. Logo especial aten-
ção deve ser dada para concretos refor-
çados commacrofibras de polipropileno,
visto que a sua degradação, mesmo que
parcial, pode comprometer a capacida-
de resistente da estrutura em tempera-
turas inferiores ao que ocorre para fibras
de aço. Como o comportamento pós-
-fissuração é fortemente influenciado pe-
las propriedades mecânicas das fibras, é
importante parametrizar o grau de dano
a que as fibras estão sujeitas em função
de sua temperatura de exposição no in-
terior do concreto.
Além disso, faz-se necessária a si-
mulação dos mecanismos que envolvem
as fibras e sua interação com a matriz
cimentícia para caracterização da carga
de pico e processo de deslizamento-
-arrancamento da fibra no CRF. Estas
alterações podem vir a gerar alterações
significativas da resistência e energia de
arrancamento das fibras, culminando em
alterações no comportamento global do
compósito. O ensaio mais utilizado para
esta caracterização é o ensaio de arran-
camento (
pullout
), que busca identificar
alterações na interface fibra-matriz atra-
vés da determinação das cargas asso-
ciadas ao arrancamento. Os resultados
deste tipo de ensaio podem ser utilizados
para refinar modelos computacionais de
a
b
c
d
u
Figura 2
Interface entre macrofibra sintética e matriz, sendo (a) temperatura ambiente e após aquecimento até 400°C
em diferentes zonas do CRMFS: (b) Zona 1 (c) Zona 2 (d) Zona 3 (adaptado de [6])