CONCRETO & Construções | Ed. 89 | Jan – Mar • 2018 | 45
na decomposição da pasta, com perda
das propriedades ligantes.
Aliado a esse fato, as pressões origi-
nadas pela formação de vapor de água
nos poros e as tensões originadas pelos
gradientes de temperatura, dependentes
das taxas de aquecimento do incêndio,
levam à deterioração do concreto, mani-
festada por desagregação ou esfarela-
mentos da sua superfície, com despren-
dimento de camadas superficiais pouco
espessas, mas de longa extensão, co-
nhecidas por delaminação, ou até a
lascamentos, de ocorrência localizada,
algumas vezes explosivos (
spalling
, geral-
mente entre 250
o
C e 400
o
C), de forma-
ção instantânea e com geração de gran-
des cavidades no concreto (KALIFA et al,
2000). Mas, o que ocorre propriamente
com os constituintes da pasta endureci-
da quando em situação de incêndio? A
Figura 1 correlaciona os aspectos ma-
croscópicos e as transformações dos
constituintes da pasta de cimento.
De fato, sob condições de aumento
de temperatura, a partir de 80
0
C, embo-
ra visualmente não se observe nenhuma
alteração na estrutura do concreto, em
escala microscópica começa o fenô-
meno de desidratação das acículas de
etringita cristalizada que, por volta de
100
0
C, se transforma em etringita amor-
fa. Por volta de 200
0
C, com a perda da
fase líquida dos poros, começam a ser
identificadas feições superficiais de mi-
crofissuração, que, no elemento estru-
tural, fica visível a olho nu por volta de
300
0
C. Nessa temperatura ocorre a de-
composição dos aluminatos hidratados
da pasta. Entre 480
0
C e 550
0
C, ocorre
a desidroxilação da portlandita, que se
transforma em cal livre, e a fissuração no
elemento estrutural deixa de ser superfi-
cial para se tornar mais profunda . Por
volta de 570
0
C, verifica-se o início da
fissuração dos agregados quartzosos,
pois ocorre o fenômeno de transforma-
ção alotrópica do quartzo
α
em quart-
zo
β
, que embora reversível, leva a um
aumento de volume de 0,8%, com forte
repercussão nas propriedades físicas
do agregado. Por volta de 800
0
C, é que
se inicia a descarbonatação dos agre-
gados calcários, explicando o melhor
comportamento ao fogo dos concretos
com esse tipo litológico de agregado em
relação aos agregados de composição
granítica (NEVILLE, 1997). Uma forte
porosidade pela perda completa do CO
2
do agregado calcário somente ocorre a
partir de 1000
0
C. Já, os principais mine-
rais do granito (quartzo, feldspato e mica)
se comportam de maneira diferenciada
frente ao aumento de temperatura, per-
dendo a coesão entre 800
0
C e 1000
0
C,
sofrendo forte retração, que leva à fissu-
ração generalizada do agregado. A partir
de 1100
0
C, a pasta de cimento começa
a se tornar vitrificada pelo aparecimento
das ligações cerâmicas em detrimento
das ligações hidráulicas. Como conse-
quência, há formação de wollastonita
(silicato de cálcio), a partir do C-S-H
original, e de anidrita (sulfato de cálcio
anidro), a partir da etringita original. Pela
perda das propriedades hidráulicas,
ocorrem esfarelamento e desagregação
total do concreto do elemento estrutural.
3. OS MÉTODOS ANALÍTICOS DE
ESTUDO DA MICROESTRUTURA
3.1 Análises Termodiferencial e
Termogravimétrica (ATD/ATG)
As análises termodiferencial e ter-
mogravimétrica constituem procedi-
mentos analíticos que permitem es-
tudar o comportamento térmico de
determinada amostra sob uma taxa
de aquecimento, isto é, determinar a
presença e/ou teores dos constituin-
tes suscetíveis a reações químicas
ou fenômenos físicos em função do
aumento da temperatura. Os resulta-
dos das análises podem ser observados
u
Figura 1
Transformações na microestrutura do concreto com o aumento da temperatura
e sua relação com efeitos visuais a olho nu