Revista Concreto & Construções - edição 91 - page 6

6 | CONCRETO & Construções | Ed. 91 | Jul – Set • 2018
u
homenagem póstuma
Péricles Brasiliense Fusco
e seu legado inestimável de
aprendizado sobre as estruturas
A
comunidade técnica brasileira
despediu-se em julho último do
notável engenheiro e professor
Péricles Brasiliense Fusco, nos seus 88
anos, mais de 60 deles dedicados à en-
genharia de estruturas.
Formado na turma de 1952 na Es-
cola Politécnica da Universidade de São
Paulo, sua paixão pelas estruturas levou-
-o, meses antes de se formar, a projetar
seu primeiro edifício alto como estagiário
no Escritório de Paulo Franco Rocha. A
esse primeiro projeto seguiram-se muitos
outros, não só de edificações, mas tam-
bém de obras de infraestrutura, como
pontes, viadutos e túneis, bem como
de obras industriais. Entre as obras mais
marcantes das quais participou, pode-se
citar: os projetos das fábricas da Com-
panhia Siderúrgica Paulista (Cosipa), da
Companhia Brasileira de Alumínio (CBA),
da usina hidrelétrica de Itaipu e da linha
norte-sul do Metrô de São Paulo.
Essa vasta e profícua atuação profis-
sional na engenharia de estruturasmante-
ve-se alicerçada na sua vocação para en-
sinar e aprender, que o acompanhou até
o final de sua vida. Em entrevista concedi-
da à Revista CONCRETO & Construções,
em sua edição 73 (a entrevista pode ser
acessada no site
)
,
Péricles Fusco nos conta que leu os dois
primeiros volumes da obra de Moersh,
o criador da teoria do concreto armado,
“linha por linha, capítulo por capítulo, às
vezes, mais de uma vez, sempre após o
jantar”, durante seu quinto ano no curso
de Engenharia Civil. Segundo suas pró-
prias palavras, “intuitivamente aplicava a
regra de ouro do aprendizado, já ensina-
da por Aristóteles: para saber algo, você
deve saber até a última minúcia, até a
menor de suas partes!”.
Essa sua vocação por aprender o
capacitou a ensinar, primeiramente a
disciplina de estabilidade das constru-
ções, na Faculdade de Engenharia In-
dustrial (FEI), em 1954, e posteriormen-
te as disciplinas de concreto armado
e projeto de estruturas, entre outras,
na Escola Politécnica da USP, a partir
de 1956, onde veio a se aposentar em
1997, depois de ter formado 21 mes-
tres e 21 doutores.
Seu interesse pelo ensino e pesquisa
foi consolidado por sua passagem pelo
Instituto de Pesquisas Tecnológicas
(IPT), de 1953 a 1956, onde, segundo
ele, aprendeu tudo o que era possível
aprender sobre ensaios em estruturas.
Seu maior aprendizado durante este pe-
ríodo, confessado na referida entrevista
foi de que “nada supera a evidência!
Cristo usou a evidência para provar que
ele era divino! Ele fez milagres, que eram
evidências de seus poderes divinos. A
prova da verdade é a evidência!”.
Na Poli-USP, Fusco foi o primeiro
professor brasileiro do recém-lançado
curso de engenharia naval, onde ensi-
nou sobre as estruturas aos seus cole-
gas de turma, pois foi ao mesmo tempo
aluno nas demais disciplinas do curso.
De volta à Engenharia Civil na década
de 1970, ele defendeu sua livre-docên-
cia com base no novo panorama de
conhecimentos sobre o concreto es-
trutural baseado em pesquisas promo-
vidas pelo Comitê Europeu do Betão
(atualmente Federação Internacional
do Concreto –
fib
). Com este estudo,
o professor Fusco pode contribuir para
que, por um lado, o coeficiente de se-
gurança de majoração das ações fosse
reduzido e, por outro, para que o coe-
ficiente de minoração da resistência do
concreto fosse aumentado na revisão
da norma brasileira ABNT NBR 6118,
parâmetros vigentes até hoje na referi-
da norma brasileira de projetos de es-
truturas de concreto.
O professor Fusco tornou-se profes-
sor titular da Escola Politécnica da USP
em 1980, quando passou a se dedicar
integral e exclusivamente ao ensino e à
pesquisa. Foi chefe do Departamento de
Estruturas e Fundações, criador e primei-
ro diretor do Laboratório de Estruturas e
Materiais (LEM), e relator da Comissão
Escola Politécnica 2000, que visitou o
mundo para aprender como os países
desenvolvidos ensinavam engenharia.
Ele nos legou verdadeiras obras-
-primas da literatura técnica, como seu
livro “Técnicas de Armar as Estruturas
de Concreto”, imprescindível no acervo
bibliográfico dos escritórios brasileiros
de projeto. Com 13 livros escritos, seu
mais recente é “Introdução à Engenha-
ria de Estruturas de Concreto”. Nele,
consolidando sua vasta experiência no
ensino-aprendizado e preocupado com
as deficiências dos estudantes brasi-
leiros que chegam ao ensino superior,
o professor Fusco busca estabelecer
alguns princípios básicos da arte de
aprender. Desta obra, destacamos
mais uma de suas lições que ficarão
para a posteridade: “Como o aluno
julga que aprendeu? Se ele for capaz
de ensinar o que aprendeu para outro
colega ou para si mesmo, como se as
ideias fossem invenções suas”.
Foi-se o homem, fica seu legado!
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